Câmara criou comissão para acompanhar as investigações. PGR pediu atuação “federalizada” e Barroso disse que caso “mostra combinação de desigualdade, corrupção e mediocridade”
por Hylda Cavalcanti, da RBA
O clima de consternação com a morte da vereadora carioca Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes, também imperou no Congresso Nacional, na Procuradoria-Geral da República (PGR) e nos tribunais superiores. Os parlamentares fizeram passeata interna na Câmara, levantando flores e lembrando as causas de defesa dos direitos humanos e igualdade social defendidas pela vereadora. Foi realizada, ainda, uma sessão solene em sua homenagem e instalada uma comissão externa para investigar o caso. Mas o ponto mais relevante foi a associação feita entre o assassinato e motivações políticas e contrárias à ordem democrática.
Na Câmara, lembraram a ameaça à democracia deputados como Jean Wyllys (Psol-RJ) e Érika Kokay (PT-DF). No Senado, se manifestaram da mesma forma Lindbergh Farias (PT-RJ) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP). No Judiciário, declarações neste sentido foram feitas pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luiz Fux, e pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Fux se disse “chocado com tudo o que aconteceu”. Já Barroso afirmou que o caso “mostra a combinação medonha de desigualdade, corrupção e mediocridade que temos visto, nos últimos tempos, no Rio de Janeiro”. “É um circulo vicioso difícil de romper e que tem levado a situações de extrema violência”, ressaltou.
Pouco tempo depois, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, sugeriu a realização de uma investigação “federalizada” para apurar o caso – o que é observado, conforme a Constituição Federal, em situações de crime de caráter político.
Cobranças à intervenção federal
No Legislativo, em meio ao sentimento de pesar dos parlamentares que tinham uma relação mais próxima com a vereadora, chamou atenção, na Câmara, a fala do presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que sempre demonstrou ser favorável à intervenção federal na área de Segurança Pública no Rio de Janeiro. Maia disse que a força policial no Rio “continua sendo sucateada” e cobrou a coordenação da intervenção.
“Sempre achei que a intervenção precisa de diagnóstico, planejamento e execução e sei que estão trabalhando nisso, ainda não chegaram a esta última etapa. É preciso que o planejamento fique pronto logo e seja transparente para todos e que o governo federal entenda que não pode haver esse sucateamento das polícias”, destacou.
O deputado Miro Teixeira (Rede-RJ) lembrou que este foi mais um caso que aumenta o número de registro de 181 líderes de defesa de direitos humanos assassinados em 2017. “Vamos apurar e buscar a punição dos responsáveis”, afirmou, em tom comovido.
Também muito emocionado, o deputado Jean Wyllys, do mesmo partido da vereadora, disse que os parlamentares vão se juntar para tomar as devidas providências. “Estamos aos pedaços agora, mas vamos unir nossas forças e dar continuidade a esta luta. Não vamos esquecer que ideias são à prova de bala”, ressaltou.
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) disse que é importante, neste momento, o Congresso voltar a discutir a proposta que trata do abuso de autoridade, em tramitação na Casa, uma vez que na última segunda-feira Marielle Franco fez denúncias contra a violência policial em Acari, comunidade na zona norte do Rio de Janeiro. Chinaglia criticou, ainda, o discurso de ódio observado nas redes sociais contra a pauta de direitos humanos.
‘Morreu porque defendia os seus’
No Senado, Lindbergh destacou que Marielle foi “uma lutadora em defesa dos vulneráveis, dos jovens negros moradores da favela”. “Ela morreu porque defendia os seus, falava da vida nas favelas e denunciava o que estava acontecendo de errado, mostrava que a vida de um jovem negro morador da favela hoje vale pouco. A dor é muito grande, foi um atentado à democracia. Estou muito abalado, porque sei o que Marielle representava”, afirmou.
Jorge Viana (PT-AC) pediu à presidência do Senado que solicite a participação da Polícia Federal na investigação. A senadora Ana Amélia (PP-RS), mesmo integrante da base aliada do governo, disse que o crime foi “uma provocação”. “Espero que as autoridades que estão comandando essa intervenção no Rio deem uma resposta imediata, com uma investigação rigorosa para que o mais rápido possível saibamos a origem e os responsáveis por esse crime bárbaro, não apenas a uma mulher, mas a uma parlamentar, que morreu por uma causa”, destacou.
A comissão externa criada é formada pelos deputados Jean Wyllys, Erika Kokay, Luiza Erundina (Psol-SP) e Wadih Damous (PT-RJ), que vão acompanhar de perto toda a apuração sobre o assassinato da vereadora e seu motorista.
“O caso é um exemplo de feminicídio e de violência política contra a mulher. Que seja simbólico e que a Casa se envolva na comissão externa com a participação de todos os parlamentares, em especial da bancada feminina”, disse a deputada Professora Dorinha Seabra Resende (DEM-TO), logo após a instalação do grupo.