Antônio Escrivão Filho e José Geraldo de Sousa Júnior apontam equívocos no voto do ministro relator do HC de Lula
Os juristas Antônio Escrivão Filho e José Geraldo de Sousa Júnior criticaram a citação feita pelo relator do julgamento do habeas corpus (HC) do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no STF, Edson Fachin, ao livro de sua autoria Para um Debate Teórico-Conceitual e Político sobre os Direitos Humanos.
O ministro citou o trabalho realizado pelos juristas para afirmar que o Brasil teria sofrido uma condenação na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) devido à morosidade dos processos de justiça. O trabalho dos juristas analisa o processo levado à CIDH sobre o assassinato do agricultor Sétimo Garibaldi.
Segundo Escrivão, “o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Garibaldi, não em função da morosidade em si. Foi condenado porque tratava-se de um caso de um assassinato de um trabalhador sem terra e sequer foi investigado pelo Brasil”.
Para o jurista, a morosidade do sistema de justiça no Brasil está ligado à seletividade, e não a um suposto excesso de garantias. “O Judiciário brasileiro apresenta sim uma morosidade. Nós costumamos compreender isso a partir de alguns pontos. O primeiro dele é que se trata de uma morosidade seletiva. Existe uma seleção realizada pelos agentes da justiça. Uma seleção de quem será julgado e punido, e quem pode esperar pelo seu processo. Nós verificamos, por exemplo, que no caso de violência contra defensores dos direitos humanos, sempre verificamos que eles são criminalizados, tendo ações judiciais contra si, mas os crimes que são praticados contra eles, agressão, tentativa de homicídio, ameaças, esses crimes não entram num rol de investigações e de julgamentos. Então a morosidade também é seletiva”, denuncia.
Equívocos
Para José Geraldo de Sousa Júnior, coautor do livro, o ministro Fachin se equivoca duplamente: primeiro ao fazer uma leitura falha do caso referido e, segundo, por atribuir aos autores uma postura punitivista no campo do direito penal, o que não corresponde à realidade.
“O que causa maior estranheza é que ele tenha reivindicado como abono de sua leitura equivocada exatamente intérpretes teóricos e instituições que são notadamente reconhecidos na luta jurídica pela afirmação da dignidade da pessoa humana e do reconhecimento da capacidade constitutiva de direitos pelos movimentos sociais”, afirma.
Sousa destaca que, independentemente da leitura equivocada do ministro Fachin, é importante esclarecer que sua posição diverge do relator do HC, que votou contrariamente à garantia da presunção da inocência até que se esgotem as possibilidades de recurso. “Essa é uma conquista civilizatória. A própria concepção do direito penal coloca a abolição da pena de prisão e da garantia a todo custo das exigências de demonstração cabal de culpabilidade. E por isso é que se presume a inocência até que todas as formas possíveis de demonstração dela sejam asseguradas no devido processo legal”, pontua.
A Organização Terra de Direitos, que também acompanha o processo do Sétimo Garibaldi na CIDH, divulgou nota pública em que afirma receber com “estranhamento e preocupação” as citações do ministro Fachin. Segundo o comunicado, “a Terra de Direitos repudia de forma contundente, por irresponsável, qualquer ilação de que o combate a violações de direitos humanos, incluindo atentados à vida de ativistas, exija a flexibilização, de outro lado, de direitos e garantias fundamentais sacramentados na Constituição”.
Edição: Thalles Gomes