“Paulo Fonteles, sem ponto final” é um livro de afeto. A afeição foi notória durante o lançamento oficial da obra escrita pelo jornalista Ismael Machado, na noite desta terça-feira (10/04) na sede da OAB – Pará. A noite de autógrafos reuniu familiares e amigos de luta de um dos mais simbólicos militantes dos direitos humanos no Pará, o ‘advogado do mato’ Paulo Fonteles, assassinado em 1987 por pistoleiros a mando de um consórcio do crime formado por grandes empresários e latifundiários paraenses.
O livro é resultado de uma ação conjunta do Instituto Paulo Fonteles de Direitos Humanos, Fundação Maurício Grabois e Editora Anita Garibaldi.
Com cerca de 300 páginas, o livro surgiu inicialmente para lembrar os 30 anos do assassinato de Paulo Fonteles. A ideia partiu do filho mais velho, que herdou o nome do pai. Paulo Fonteles Filho, o Paulinho, foi um dos principais responsáveis para que ‘Paulo Fonteles, sem ponto final’ ganhasse relevo.
“Eu não queria apenas contar a história de Paulo Fonteles. Achei ser uma oportunidade importante para contar a história do Pará pós-golpe militar, falar sobre as lutas políticas da esquerda, contar sobre os conflitos agrários, do golpe até à redemocratização”, diz o escritor e jornalista Ismael Machado.
A trajetória do trabalho foi feita por meio de pesquisa bibliográfica, que resultou em quase três páginas com referências de livros consultados. Foi feita também com a consulta de documentos guardados há 30 anos pela historiadora, Leila Mourão. E por meio de viagens ao sul e sudeste do Pará, onde Ismael e Paulinho Fonteles foram ao encontro dos contemporâneos de Paulo Fonteles. Gente que lutou ao lado dele na busca por justiça social.
“O livro é uma junção desses arquivos, do contato com as pessoas e da pesquisa. É um livro que tem a marca de uma emoção forte, pois além de contar uma história rica ela une pai e filho, pois tem o dedo, a mão, o sangue e o suor de Paulinho Fonteles, que infelizmente acabou não lendo o livro”, pontua o jornalista.
O livro carrega o sentimento de afeto por todas essas particularidades. Pelo envolvimento do filho, pelo depoimento das pessoas que tiveram contato com Paulo Fonteles e pelos amigos de luta, que o acompanhavam e admiravam o modo de ser do advogado e defensor das classes mais necessitadas.
“Paulo Fonteles era uma pessoa que gostava das coisas mais simples, de sentar no meio do mato e comer peixe frito na companhia de amigos, de apreciar a beleza de uma flor e apreciar o movimento das crianças”, lembra Leila Mourão.
A trajetória de luta e amizade da historiadora com Paulo Fonteles começou em 1980, quando ela chegou a Belém na companhia do marido, Neuton Miranda, para dar início à reconstrução do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), no Pará.
Leila Mourão é responsável por manter documentos importantes guardados por Fonteles ao longo de toda a trajetória do militante. “Ele tinha uma casa no bairro do Bengui e quando o oficial de justiça foi fazer a entrega do imóvel acabou retirando tudo de dentro e esses documentos foram jogados no lixo. O operário da casa me ligou e eu fui correndo junto com o meu marido pegar esses documentos. É uma grande parte da história e da memória do Pará, que é complexa, triste e de muita repressão. A partir disso eu ficava perguntando para o Paulinho o que faríamos com esse material”, recordou a historiadora.
Incentivo
O livro é resultado da iniciativa da Fundação Mauricio Grabois que preza pelo resgate da história de um lutador do povo brasileiro. O diretor administrativo e financeiro da fundação, Leocir Costa Rosa, esteve no lançamento oficial, em Belém, e disse que a vida de Paulo Fonteles é uma grande epopeia e, por isso, é importante resgatar a memória, a história e o legado da luta em defesa dos trabalhadores rurais, da democracia e dos direitos humanos.
O representante da fundação diz ainda que o lançamento do livro surge em um momento de tensão do país. “Todas essas forças que imaginávamos que estivessem derrotadas se assanham a voltar a comandar os destinos do país e voltam a influenciar a sociedade e os poderes públicos. Por isso, é importante fazer o resgate e essa homenagem a Paulo Fonteles”, pontua Leocir Rosa.
A Fundação Maurício Grabois tem o compromisso de resgatar histórias do Partido Comunista do Brasil como forma de subsidiar o trabalho do partido e dos militantes. Sobre a obra, ele diz que está muito bem escrita e bem elaborada com toda a trajetória de Paulo Fonteles.
Importância da obra
A ex-governadora do Pará, Ana Julia Carepa, compareceu ao lançamento e disse estar feliz e satisfeita com o trabalho, já que a figura de Paulo Fonteles sempre foi de um militante da democracia, na defesa dos direitos humanos, advogado dos trabalhadores rurais e lutador pela reforma agrária. “Uma pessoa que desde estudante lutou por uma sociedade socialista e sempre lutou por uma sociedade justa onde os seres humanos pudessem viver com dignidade pelas mesmas oportunidades”, afirmou a ex-governadora.
Ela pontua ainda que Fonteles tem uma importância imensa para a história da esquerda no Pará e para a construção do Partido Comunista do Brasil. “Essa obra vem num momento onde vivemos outro tipo de ditadura. Uma ditadura do judiciário, onde alguns setores rasgaram a Constituição. Por isso, é muito importante esse resgate pela história da democracia”, completa Ana Julia Carepa.
“Quando o livro foi imaginado jamais se pensou que seria lançado em um momento tão adequado, um momento em que o Brasil está numa encruzilhada e dilema para achar o caminho democrático que precisa trilhar e ao mesmo tempo se depara com retrocesso social”, afirmou o deputado estadual e militante dos direitos humanos Carlos Bordalo.
“Outro ponto curioso desse lançamento é que o idealizador da obra já não está mais presente. Pai e filho que comungaram de um mesmo sonho. Isso reveste essa obra de um ineditismo impressionante. É uma celebração para pai e filho”, afirma o deputado.
A filha de Paulo Fonteles, Juliana Fonteles, atual presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, ressaltou a importância do resgate da história do Paulo Fonteles por tudo o que representou e por ter sido precursor na luta pela posse da terra no estado do Pará. “Ele foi preso e torturado e representou uma geração que lutou por democracia e liberdade”, disse a filha.
O lançamento no prédio da OAB Pará é simbólico para a família, já que foi o local onde ele estudou. “Ele lutou e foi assassinado por defender a democracia e por defender a luta do povo brasileiro”, completou Juliana Fonteles.
O evento contou ainda com as presenças do Vereador de Belém, Fernando Carneiro representando o Partido Socialismo e Liberdade, de Jader Kahwage, representando a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB/Pará e do deputado Marcio Miranda presidente da Assembleia Legislativa do Estado Pará – Alepa que tem sido um parceiro importante no resgate da memória do ex-deputado Paulo Fonteles.
A Fundação Maurício Grabois e o Instituto Paulo Fonteles irão lançar o livro em outras cidades brasileiras. São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília serão as primeiras.
De Belém,
Bruna Lima
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