Diante de um público formado representantes de diversas entidades ligadas ao FNDC, debatedores discutiram prisão de Lula, assassinato de Marielle Franco e onda de fascismo que ameaça o país
por Felipe Bianchi, especial para o FNDC
Enfrentar os retrocessos impostos pelo golpe e a escalada conservadora na sociedade brasileira exige dedicação à disputa de narrativas, à defesa da liberdade de expressão e à luta pela democratização da comunicação. Essa foi a tônica do debate que inaugurou, neste sábado (14), a 21ª Plenária do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). A mesa contou com a presença de Joselício Junior, o Juninho, presidente estadual do PSOL; Altamiro Borges, secretário nacional de questões de mídia do PCdoB; e Paulo Teixeira, deputado federal e vice-presidente do PT.
Diante de um público formado por delegados e observadores de diversas entidades que discutem, neste final de semana, estratégias e planos de ação para a atuação do FNDC no próximo período, os debatedores discutiram temas como a prisão política de Lula, o brutal assassinato de Marielle Franco no Rio de Janeiro e como, a partir da interpretação desses fatos, os setores democráticos e populares do país devem enfrentar a aliança formada pelas elites do país, o sistema Judiciário e o oligopólio midiático.
“A ofensiva da direita é diferente do que ocorreu na década de 1990”, opina Altamiro Borges. “Ali, foi uma ofensiva neoliberal de desmonte do Estado, da nação e do trabalho. Hoje, vivemos uma ofensiva ultraneoliberal, que soma os desmontes à uma ofensiva conservadora de caráter neofascista”, acrescenta.
Para o presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, esse movimento já passou por três fases. A primeira foi a cavalgada golpista, na qual a mídia hegemônica jogou papel decisivo para pautar e mobilizar a sociedade a fim de destituir, sob premissas falsas, uma presidenta democraticamente eleita. “É uma mídia que estimulou o ódio e, inclusive, convocou atos de rua”, salienta.
A segunda fase, prossegue Borges, é a aplicação do projeto derrotado nas urnas em 2014, acumulando incontáveis retrocessos no país em menos de dois anos do impeachment. Por fim, a terceira fase: o desfecho do processo quase kafkiano que confinou o ex-presidente Lula em uma “solitária” em Curitiba, no Paraná. “Se Lula fosse candidato, as duas fases anteriores teriam sido em vão. O golpe estaria incompleto. Por isso a prisão”, argumenta.
O conluio entre uma burguesia essencialmente colonial, o aparato de hegemonia do Estado expressado no Judiciário e o aparato de hegemonia da sociedade, materializado no oligopólio midiático, é quem pode colocar em marcha uma quarta fase desse processo: “Se essa aliança sentir que pode perder as eleições, é possível que haja o cancelamento das eleições em outubro”.
A boa notícia, segundo Borges, é a maturidade demonstrada pela esquerda brasileira no momento de turbulência. A resistência em São Bernardo, os atos, cartas, acampamentos, a articulação entre Frente Brasil Popular e Povo Sem Medo, superando sectarismos e partidismos, são alguns exemplos mencionados pelo jornalista. “O problema não é Lula, é a democracia. Ninguém precisa negar as divergências para construir a convergência em defesa da democracia”, sublinha. “Um dos principais desafios colocados para a nossa resistência”, salienta, “é a disputa de narrativas”.
Militante do movimento negro, Juninho frisou que a disputa de narrativas se dá em um mundo de pós-verdades, sob a dinâmica das redes. “Se essas redes impulsionaram movimentos fascistas, também foi importante para que grupos historicamente marginalizados entrassem nessa disputa de ideias”, avalia o presidente estadual do PSOL. “A estrutura ainda é hegemonizada, mas a pequena fissura que se abriu nos dá oportunidades que precisam ser exploradas e potencializadas. Parte da construção da narrativa contra-hegemônica passa pela liberdade de Lula, pela discussão em torno da Marielle, mas temos que refletir, necessariamente, sobre a esquerda que queremos a partir do protagonismo desses setores antes invisiblizados”.
O golpe, na visão de Juninho, vem demolindo uma democracia que já era frágil e deficitária, principalmente nas periferias e nos rincões do país. “Somos uma sociedade extremamente concentradora de riquezas, com uma cidadania desigual, já que grande parcela da população tem direitos negados, além do problema da violência, que é um instrumento de manutenção dessas desigualdades”, reflete.
“Um país que assassina 60 mil pessoas por ano, sendo 70% jovens, negros e moradores da periferias, que tem 700 mil pessoas encarceradas, sendo um terço desta cifra somente no estado de São Paulo, é um Estado que restringe direitos e que é altamente punitivista”. Mais que isso, é um país no qual o machismo e o racismo estruturais ditam quem são as vítimas preferenciais dessa violência escalonada, opina o dirigente.
Vice-presidente do PT, Paulo Teixeira opina que há um Estado de exceção no país: “Uma das caras do neoliberalismo é o Estado de exceção, e sua mão é o Judiciário”. “Dizem que há um 12º ministro no Judiciário: Merval Pereira [colunista da Globo]”, ironiza o deputado. “A Globo produz ideias e a Justiça absorve. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Roberto Barroso é um exemplo caricato de quem faz esse papel de porta-voz do ideário da Globo. Tínhamos a ideia de que o STF deveria zelar pela Constituição independente do humor da sociedade, mas Barroso anunciou novos papeis para o Supremo, representativo, mesmo sem ter tido votos, e ativista, que foge às suas funções”.
Para chegarmos nesse estágio, é preciso compreender a importância estratégica da batalha da comunicação, defende Teixeira. “Lula tem mais de 70 horas de Jornal Nacional destruindo sua imagem. É um momento em que a ruptura se dá, também, pela fragilidade do sistema democrático”. Para o deputado, não ter enfrentado a questão da mídia é um dos grandes erros cometidos pelos governos de Lula e Dilma Rousseff. Por isso, “nosso programa tem de colocar a democratização dos meios de comunicação no centro da luta para restaurar e aprofundar a democracia no país”, sentencia.
21ª Plenária Nacional do FNDC traça estratégias e plano de ação
A 21ª Plenária Nacional do FNDC teve início neste sábado (14), em São Paulo, precedida pelo Seminário Internet, Liberdade de Expressão e Democracia: Desafios Regulatórios para a Garantia de Direitos, realizado entre a sexta-feira (13) e manhã de sábado, com apoio do Comitê Gestor da Internet (CGI.br).
A discussão da conjuntura é parte da Plenária, que traçará as estratégias e o plano de ação das entidades articuladas no movimento de luta pela democratização da comunicação, além de eleger a nova direção-executiva do FNDC.
A tese aprovada após a discussão da Plenária será publicada na página do FNDC após a conclusão das atividades. Fique ligado!