Partidos políticos mudam os nomes diante da grave crise de representatividade que enfrentam atualmente
A Aliança Renovadora Nacional (Arena) foi um partido político surgido em 1965 com o objetivo de dar sustentação à ditadura militar, instaurada a partir do golpe de estado do ano anterior. Poucos sabem, mas ele jamais desapareceu da cena política nacional.
Após a redemocratização, em 1985, a sigla passou a se chamar Partido da Frente Liberal (PFL), que seguiu abrigando políticos ligados aos setores que ocuparam o poder durante o regime de exceção. Em 2007, nova mudança: o partido passa a se chamar Democratas (DEM), agremiação do atual presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.
O exemplo do DEM foi seguido mais recentemente por outros partidos, que decidiram dar nova roupagem às legendas, diante da grave crise de representatividade que enfrentam. Exemplo disso foi o Partido do Movimento de Democrático Brasileiro (PMDB) que, depois de ter liderado o golpe de estado contra a presidenta Dilma Rousseff em 2016, retirou a letra ‘p’ do antigo nome, ficando apenas com a sigla MDB, a mesma que tinha durante a ditadura militar, quando foi a única oposição permitida pelo regime. A sigla deve lançar como candidato presidencial o ex-ministro da Fazenda do governo Temer, o economista e executivo do setor financeiro Henrique Meirelles.
Outro caso curioso é o atual Podemos, que pretende lançar o senador paranaense Álvaro Dias como candidato presidencial. O partido existe desde 1995 sob o nome de Partido Trabalhista Nacional (PTN), e em 2016 decidiu adotar a mesma nomenclatura de um partido espanhol progressista, surgido dos protestos populares registrados no país europeu em 2011.
Aqui no Brasil, o Podemos votou a favor da reforma trabalhista, que flexibilizou direitos históricos dos trabalhadores, da Emenda Constitucional 95, que congelou o investimento público por 20 anos, pela intervenção federal-militar no Rio de Janeiro, e se posiciona contrário à taxação de grandes fortunas.
O plágio do Podemos chegou a ser comentado pelo deputado do partido espanhol, Rafael Mayoral, através de uma rede social. “A verdade é que nós queremos dizer, muito claramente, que não tem nada a ver com a gente aqueles que defendem o Temer.(…) Podemos está com os setores populares e na luta pelo resgate da democracia”, disse o parlamentar espanhol.
O Partido Trabalhista do Brasil (PTdoB), que tem uma bancada de apenas cinco deputados no Congresso Nacional, agora se chama Avante. O Partido Ecológico Nacional (PEN), com a mesma quantidade de parlamentares atualmente, mudou para Patriota. Já o Partido Social Democrata Cristão, fundado em 1995, agora é simplesmente Democracia Cristã.
Na opinião de Antônio Augusto Queiróz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), a estratégia dos partidos desrespeita o eleitor que aspira por renovação do cenário político.
“Isso apenas demonstra o desrespeito desses partidos para com os eleitores. Porque de um lado despreza a ideologia, a doutrina, a defesa de programa, de ideias, que é o que deve ser o ponto central de qualquer partido, e busca tratar o partido como se fosse um produto comercial, a partir da propaganda, como se faz com uma marca de sabonete, tentar agregar eleitores a partir daí. E isso, do ponto de vista político e da representação política, é uma tragédia. Porque se em um primeiro momento pode haver uma simpatia do eleitor, no momento seguinte vai se descobrir que se comprou gato por lebre”, diz o diretor do Diap.
Queirós lembra que as recentes reformas do sistema eleitoral buscaram justamente criar as condições para a manutenção dos políticos já eleitos.
“De fato, a mudança na legislação eleitoral recentemente implementada sinaliza nessa direção, ou seja, foram criadas as condições para que não houvesse renovação efetiva. Se diminuiu o tempo de campanha, se vai dar prioridade no horário eleitoral e nos recursos do fundo eleitoral para quem é detentor de mandato. Portanto, dificulta enormemente a renovação”.
Em um vídeo que circula nas redes sociais, Creomar de Souza, professor da Universidade Católica de Brasília (UCB) explica a mudança de nomes dos partidos através de uma analogia com o cotidiano de muitos cidadãos.
“Quando pensamos no fenômeno recente que tem provocado que vários partidos políticos brasileiros mudem de nome, nós podemos fazer a seguinte analogia: o cidadão comum, que somos você e eu, busca comprar um carro novo, ou seja, ele quer uma opção melhor do que a que ele possui. O vendedor do carro, que é o partido político, não consegue por incapacidade ou falta de vontade transformar os modelos que ele possuir em um modelo novo. O resultado fundamental dessa questão é que os partidos hoje têm mudado o seu produto, fazendo uma maquiagem, uma nova pintura sobre o carro, e tentam convencer você, cidadão comum, e eu, de que essa nova versão é um produto novo. Sendo que o que temos é a incapacidade dos partidos políticos em proverem de fato novos nomes, novas perspectivas e olhares para o processo eleitoral que se aproxima”.
Para Queiróz, o eleitor que deseja a renovação a partir das eleições de 2018 deverá ser estratégico e procurar conhecer bem os seus candidatos.
“Acho que é preciso ter muita clareza de que essa estratégia está em curso, em primeiro lugar. Em segundo lugar, ocupar parte do seu tempo para acompanhar a trajetória dos parlamentares e seus partidos, aqueles que pertenceram a determinados governos ou que defenderam determinadas ideias, e conhecer a vida pregressa dos candidatos, para identificar aqueles que se constituem efetivamente em renovação ou renovar aqueles que tiveram uma atuação coerente.
O Brasil é um dos países com o maior número de partidos políticos de todo o mundo, com 36 legendas registradas junto à Justiça Eleitoral.
Edição: Juca Guimarães