INTRODUÇÃO

Considerando a realização de diligência na ocupação 1º de Janeiro localizada no município de Castanhal, local em que foi assassinada a Sra. Kátia Martins, assim como a realização de Audiência Pública sobre o acirramento da violência no campo realizada na ALEPA, no auditório João Batista no dia 23.05.2017, o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Alepa é surpreendido pelas notícias de nova chacina  de trabalhadores rurais no Pará, desta vez na região Sul do Estado, especificamente na fazenda Santa Lucia no município de Pau D’arco a aproximadamente 900 km da capital.

Os primeiros relatos da imprensa dão conta de um massacre ocorrido em razão de cumprimento de liminar de reintegração de posse, o que rapidamente foi corrigido pela SEGUP que explicou se tratar de operação de cumprimento de mandados de busca e apreensão e prisões temporárias e preventivas de  de 16 indivíduos relacionados com investigações de homicídio e outros crimes, aparentemente não relacionados com os conflitos agrários. Estranhamente, o suposto confronto relatado pelas autoridades policiais do local davam conta de grupo fortemente armado, que aguardava o contingente policial entrincheirado e pronto para resistir até as últimas conseqüências, quando novas informações começaram a aparecer através denúncias de movimentos sociais demonstrando grande impaciência das forças de segurança com a consolidação de uma versão implausível dos fatos, reforçada pela sumária destruição das cena do crime, com a remoção de corpos, projéteis, cápsulas, pertences das vítimas e tudo o que poderia corroborar a versão apresentada pelo policiais.

Diante destas incertezas o presidente da Comissão de Direitos humanos da Alepa, Deputado Bordalo convocou reunião extraordinária da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor realizada em 25 de maio de 2017, às 10:30 na Sala VIP; para avaliar as informações oficiais disponíveis na presença dos titulares e suplentes da comissão, o que contou com prestimosa presença do Secretário de Estado de Justiça e Direitos Humanos, Dr. Michel Durans; o Delegado Diretor de Policia do Interior, DPC João Bosco e o Coordenador do SIC da SEGUP, Cel. Paulo Figueiredo representando o Secretário Jeannot Jansen e assistida pelos seguintes convidados:

  1. LAJUSA/UFPA – Dra. Paula Arruda;
  2. Comissão de Direitos Humanos da OAB/PA – Juliana Fonteles;
  3. Comissão de Direito Agrário da OAB/PA – Ibraim Rocha;
  4. Núcleo Agrário da Defensoria Pública do Estado – João Paulo Ledo;
  5. Núcleo de Direitos Humanos da DPE- Juliana Oliveira;
  6. Ângela Lopes – Presidente FETAGRI PA
  7. José Gonçalves  – FETRAGI/PA;
  8. Cléber Resende – CTB/PA;
  9. Promotoria Agrária MPPA – Ione Nakamura;
  10. GATI MPPA – Vera Tavares;
  11. Terra de Direitos – Pedro Martins;
  12. Instituto Paulo Fonteles de Direitos Humanos – Paulo Fonteles Filho;
  13. Assessoria Dep. Dirceu TenCaten – Emerson Caldas

Justificaram ausência face o convite urgente e a não possibilidade de remarcação dos compromissos pré-agendados:

  1. MPF – O Procurador de Direitos Constitucionais se encontra no Marajó e a Procuradora Chefe estava em Sessão no TRE-PA;
  2. Ouvidoria do Sistema de Segurança Pública – estava de viagem ao Marajó;
  3. DPU – Defensora de Direitos Humanos tinha Compromisso prévio;
  4. Dep. Divino – justificou viagem ao Interior;
  5. Dep. Dirceu Ten Caten – justificou viagem ao Interior;
  6. Dep. Fernando Coimbra – justificou viagem ao Interior;
  7. Dep. Renato Ogawa – justificou viagem ao Interior.

Após a apresentação da versão oficial dos fatos os convidados da sociedade civil, pesquisadores e representantes de movimentos sociais e dos órgãos estatais e de justiça abriram debate sobre as impressões e avaliações sobre o ocorrido, onde registra-se a manifestação do Diretor de Política Agrária da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Pará – FETAGRI/PA, que em razão de sua trajetória de militância sindical na região do suposto confronto deu elementos que suscitaram dúvidas quanto a veracidade dos fatos apontados na versão policial oficial, que tendia a separar o ocorrido do conflito agrário pela propriedade da fazenda Santa Lúcia. Dados estes fatos unanimemente os três deputados Titulares presentes àquela reunião deliberaram por solicitar a Presidência da Alepa à liberação do apoio logístico e material para diligenciar comitiva da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor aos municípios de Redenção e Pau D’arco o que foi prontamente atendido pelo Presidente Deputado Márcio Miranda, que viabilizou o deslocamento da comitiva no dia seguinte, a sexta feira 26 de maio de 2017.

Assim, dirigiram-se para verificação in loco das violações de direitos ocorridas no local do conflito agrário, investigar suas causas relacionadas à política agrária, a acompanhar a investigação dos casos de homicídios, tentativas de homicídios, ameaças, destruição de casas, plantações, a observação de cumprimentos de protocolos de segurança e investigação criminal e garantir a proteção de vitimas, testemunhas e defensores de direitos humanos eventualmente ameaçados após o possível massacre.

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CONTEXTUALIZAÇÃO DOS CONFLITOS AGRÁRIOS NA REGIÃO SUL DO ESTADO DO PARÁ

Os conflitos agrários na Amazônia tem suas raízes profundamente fincadas no processo de ocupação do território amazônico pautado pelos governos da Ditadura civil militar iniciado em 1964, que fundou-se na transferência de populações das diversas regiões brasileiras em direção a amazônia e em especial a região sul e sudeste do Pará como conseqüência da implantação de grandes hidrelétricas e projetos de exploração mineral e o favorecimento de acesso a credito para a implantação de grandes projetos agropecuários em contrapartida de financiamento público de multinacionais e grupos empresariais do sul e sudeste brasileiro pelos bancos de fomento.

Ao longo das décadas o processo de ocupação se intensificou pela pressão de massas humanas sem acesso a terra convivendo com a grande concentração fundiária pautada na grilagem de terras para fraudes ao sistema de fomento ao desenvolvimento e o descompromisso com a função social da propriedade.

Estas tensões que per si, são oriundas de violações a direitos humanos reconhecidos pelo estado brasileiro no Pacto de San José da Costa Rica culminaram várias vezes em massacres perpetrados pelo abuso das forças de segurança do estado no cumprimento da imposição da ordem pública emanadas pelo judiciário.

Lembremos duas destas ocasiões: O Massacre da Ponte ou Massacre de São Bonifácio (Marabá/1987) e o Massacre de Eldorado dos Carajás (Eldorado dos Carajás/1996), eventos reconhecidos internacionalmente como decorrentes de violações de direitos humanos do estado brasileiro.

No contexto da redemocratização, estes dois eventos nefastos impuseram ao estado mecanismos de controle das forças de segurança do estado, refinamento de políticas públicas e a implementação de uma agenda de desenvolvimento agrário com fulcro no fortalecimento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária que nos anos 2000 viu suas competências relativas à regularização fundiária, a recuperação e ampliação da infraestrutura rural, a criação de assentamentos e o fomento das atividades produtivas de assentados florescer e avançar significativamente para a composição do passivo agrário e para a redução das desigualdades no campo.

Entretanto, o órgão que concentrou tantas prerrogativas para a implantação desta agenda de desenvolvimento foi tendo, a partir de 2010, suas atribuições repartidas entre outras instituições e ou programas no âmbito federal.

A título de exemplificação, a infraestrutura rural dos assentamentos foi repartida, com a criação do Programa Nacional de Habitação Rural que passou a Caixa Econômica Federal a competência para, a partir das informações geradas pelo INCRA, conduzir o processo de concessão de crédito para a edificação de habitações em assentamentos, o que desencadeou um processo de burocratização e emperramento da política pública que na década anterior, mesmo com ressalvas e eventuais desvios apresentou números exitosos e incontestáveis diminuindo consideravelmente o déficit habitacional rural.

Outra vertente desta repartição de competências não proveitosa para o fim que se propunha foi a criação do Programa Terra Legal sem a proatividade jurídica necessária para a antecipação dos conflitos e a atuação preventiva através da arrecadação das terras devolutas da união, com caráter passivo, sendo necessária a provocação administrativa do programa para a efetiva apuração da cadeia dominial e a atualização cartográficas com modernas tecnologias das áreas que foram objeto de quadrilhas de grilagem nas décadas de 70, 80 e 90.

Em que pese a tentativa de modernização e a descentralização da estrutura ter sido raciocinada para aumentar o controle público dos recursos envolvidos nestes investimentos, causou na prática um engessamento do direito ao acesso ao investimento público na forma de habitações, infraestrutura viária e de escoamento e principalmente na regularização fundiária.

No âmbito do Estado do Pará, o problema é ainda maior. Se o INCRA teve e ainda dispõe de capacidade operacional e rede de atendimento para o trato com seu público alvo, o Iterpa sequer tem pólos regionais e padece da mesma ausência de proatividade jurídica, precisando ser demandado judicial e administrativamente para agir e fornecer subsídios para a regularização fundiária de áreas em que o conflito já esta deflagrado. Esta inoperância estrutural pela ausência de competência formal do órgão, alia-se com o esvaziamento institucional do órgão, que até 2010, ainda criou assentamentos no estado do Pará constituindo parcerias estratégicas com o INCRA que assumia os investimentos em infraestrutura necessários para viabilizar a colonização da área e fazer cumprir a função social das terras.

Este cenário de crise institucional instalada na política de reforma agrária foi respaldando e respaldou-se numa crescente infraestrutura pública baseada no conflito instalado, que toma tamanha dimensão que a sociedade passa a exigir um suporte institucional apropriado para dirimir os conflitos a partir da judicialização. Criam-se as Delegacias Especializadas em Conflitos Agrários – DECA, o Ministério Público descentraliza sua estrutura e cria Promotorias agrárias, movimento que é replicado pela Defensoria Pública do Estado no âmbito de seu papel institucional, onerando o estado que parece se orientar pelo fomento ao conflito dada a sua inoperância quanto as causas estruturais do problema.

Neste contexto se insere a ocupação da Fazenda Santa Lúcia, cuja área total supera em extensão total o limite máximo de regularização fundiária permitido pela Constituição do Estado do Pará que em seu art. 241, incisos I e II fixam os limites de competência do órgão executivo e do limite para a regularização fundiária com autorização legislativa prévia.

A Fazenda Santa Lúcia é um exemplo da ausência do estado no contexto da prevenção dos conflitos agrários no Pará.

Ocupação da Fazenda Santa Lúcia

A Fazenda Santa Lúcia, localizada no Município de Pau D’arco/PA, ocupada desde 2010, por grupo de trabalhadores rurais com intuito de constituir projeto de assentamento da reforma agrária e fazer cumprir a função social da propriedade, produzindo para seu sustento e comercialização de excedentes tal como feito até a presente data com a implantação de roças de mandioca, milho, melancia e outras culturas.

Em 2013, o pretenso proprietário ingressou com Ação de Reintegração de Posse, sendo deferida e realizada a primeira reintegração de posse da Fazenda Santa Lúcia, através do Processo nº 00008492.25.2013.814.0045.

Em novembro de 2015, a referida Fazenda foi reocupada por grupo de trabalhadores rurais com apoio da então Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar – FETRAF, esta ocupação retomou as atividades produtivas dos acampados em que pese o desmantelamento de suas roças e benfeitorias por parte do pretenso proprietário.

Após ação judicial, foi realizada a segunda reintegração de posse da fazenda, rapidamente reocupada após a saída da policia que deu apoio ao mandado.

Dadas as dimensões da fazenda por algum tempo coexistiram na área ocupantes e pretensos proprietários que após frustradas negociações com o INCRA, passaram a tentar ocupar a terra algumas cabeças de gado, refazendo parte da pastagem e posteriormente contratando segurança armada para a defesa das benfeitorias e bens agora alocados.

Em razão disso, na data de 26 de outubro de 2016 os proprietários pleitearam na justiça novo cumprimento da medida liminar de reintegração de posse, que foi concedida e ficou de ser realizada no ano de 2017.

No dia 23 de fevereiro de 2017, após os fatos e solicitações por parte dos advogados do pretenso proprietário, o oficial de justiça esteve na fazenda citando todos os invasores a deixarem a fazenda em 24h sobre pena de multa.

Em 23 de março de 2017 a Justiça autorizou o cumprimento da liminar para reintegração, na decisão foi requisitado pela vara agrária de Redenção para fosse efetuada a prisão em flagrante daqueles que eventualmente estivessem na área incorrendo no crime de desobediência, o que foi realizado em 20 de abril de 2017, nesta oportunidade e sem reação por parte dos acampados, 4 (quatro) pessoas localizadas no interior da propriedade foram conduzidas para a delegacia de policia em flagrante de desobediência, os demais ocupantes refugiaram-se no acampamento provisório chamado de “corredor”, área arrendada de colono do assentamento Guarantã que faz divisa com a fazenda.

Durante o mês de abril os pretensos proprietários contrataram a empresa ELMO SEGURANCA LTDA EPP, CNPJ 13.617.887/000103, para realizar os serviços de segurança patrimonial privada, o que marca o inicio da escalada da violência contra os ocupantes, culminando, em 30 de abril de 2017, com o homicídio de Marcos Batista Ramos Montenegro, suposto segurança da fazenda, a serviço da atingido por um disparo de arma de fogo no rosto, ocorrência esta não elucidada, visto que o Inquérito Policial correu em segredo de justiça.

A polícia local alegadamente com base na apuração deste homicidio, representou pelas Prisões Preventivas e Busca e Apreensão, em contra ANTONIO PEREIRA MILHOMEM, vulgo “TONHO”; RONALDO SILVA DOS SANTOS, vulgo “LICO” e JANE JULIA DE OLIVEIRA (vitimas fatais da operação policial em analise) e contra ANTONIO PEREIRA DA SILVA, FERNANDO ARAUJO DOS SANTOS; GENÁRIO NEVES MIRANDA, além das prisões temporárias dos indivíduos conhecidos por“ARAUJO”; “CLEBER” (sobrinho do TONHO e possivelmente a vitima fatal Weclebson Pereira Milhomem); “ADRIANO”; “XEXEU”; “CAVEIRA”; “GURI”; “NEGUINHO DO VIGILATO” e “FILHO DO CANGALHA”, as quais foram deferidas pela Justiça da 2ª Vara Penal de Redenção no dia 17/05/2017, pela Juíza de Direito, Dra. Leonila Maria de Melo Medeiros.

Da Operação Policial de cumprimento de mandados busca e apreensão e prisão preventiva e temporária

Sendo assim, conforme os fatos depreendidos pela mídia, no dia 24 de maio de 2017, por volta das 06h30min, a equipe policial civil da DECA de Redenção e equipe do Grupo Tático Operacional da Polícia Militar do referido município se dirigiram à Fazenda Santa Lúcia a fim de dar cumprimento a Mandados de Prisão Preventivas e Temporárias, deferidos pelo Juízo da Comarca de Redenção, em razão de representação feita pelo delegado titular da DECA de Redenção, visto que havia uma associação criminosa na fazenda Santa Lucia que teria praticado os crimes de homicídio, em desfavor de MARCOS BATISTA RAMOS MONTENEGRO, funcionário de uma empresa de Segurança contratado pelo proprietário da fazenda, de tentativa de homicídio, de esbulho possessório, de associação criminosa armada, de dano qualificado e outros, contando com 29 policiais, sendo 4 policiais civis e 24 policiais militares, que até o presente momento não tiveram seus nomes divulgados pela Secretaria de Segurança Pública, do que resultou nas seguintes vitimas fatais:

1)             Antônio Pereira Milhomem;

2)             Bruno Henrique Pereira Gomes;

3)             Hércules Santos de Oliveira;

4)             Jane Júlia de Oliveira;

5)             Nelson Souza Milhomem;

6)             Ozeir Rodrigues da Silva;

7)             Regivaldo Pereira da Silva;

8)             Ronaldo Pereira de Souza;

9)             Weldson Pereira da Silva e

10)      Weclebson Pereira Milhomem

DUAS VERSÕES

Versão dos policiais envolvidos na operação:

A partir deste ponto apresentam-se duas versões distintas dos fatos que levaram a óbito 10 pessoas nas dependências da Fazenda Lúcia, em circunstâncias nebulosas tendo em vista a ação delituosa das duas policias na destruição da cena do crime.

Neste aspecto o presente relatório, acaba por antecipar suas conclusões uma vez que o adestramento policial militar e o treinamento policial civil, ambos partem da mesma diretriz operacional elementar: a proteção da cena do crime, prevista no PROCEDIMENTO OPERACIONAL PADRÃO PERÍCIA CRIMINAL – MINISTÉRIO DA JUSTIÇA; no ATO DO COMANDANTE GERAL, INSTRUÇÃO NORMATIVA N° 001/2013 – CorGeral, que instruem objetivamente os procedimentos a serem adotados por agentes de segurança do estado quando no comando de operações ou o mais antigo envolvido em ocorrência que resulte no evento morte ou lesão corporal.

De acordo com a versão policial, as equipes policiais ao chegarem na sede da fazenda, encontraram o local onde os seguranças ficavam alojados, que há alguns dias havia sido supostamente destruído pelos ocupantes, mediante incêndio, porém não encontraram nenhum dos procurados. No decorrer da diligência a equipe policial militar avistou uma pessoa suspeita de ser um dos procurados que ao empreender fuga acabou sem intenção, delatando a direção em que os demais membros do grupo encontravam-se refugiados.

Na versão da policia, ao aproximarem-se do local a fim de localizar os procurados e dar cumprimento aos mandados de prisão, foram recebidos a tiros, iniciando sua reação que resultou na morte das 10 pessoas e no baleamento de pelo menos mais 4 vítimas não fatais, segundo a policia a maior parte do grupo fugiu.

Após o suposto confronto e dispersada parte dos agricultores, a equipe policial, por comando de autoridade policial civil ou militar cuja identidade ainda não foi revelada pela Secretaria de Segurança Pública, decidiu pela remoção dos corpos, transportando-os até o local onde as viaturas estavam estacionadas o que os levou a percorrer grande distancia manuseando os corpos das vítimas sem o devido preparo e cautelas formais, amontoando os mesmos uns sobre os outros nas caçambas das viaturas, trasladando os corpos a sede do município de Redenção apresentando-os ao hospital Iraci Machado de Araújo.

Além dos corpos a equipe de policiais recolheu 11 armas que supostamente teriam sido usadas pelo grupo de agricultores procurados, dentre as quais se encontrava um fuzil 762 e uma pistola Glock .380. Teriam sido recolhidos cápsulas de munição deflagradas e munição intacta.

            Versão das vítimas ouvidas pelos Deputados Estaduais Bordalo, Lélio Costa e Ozório Juvenil, em 26 de maio de 2017, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil – subseccional Redenção

Informações colhidas no velório de Hercules Santos de Oliveira

            Na tarde da sexta feira, 26 de maio de 2017, por volta de 14h comitiva liderada pelos Deputados Bordalo, Leilio Costa e Ozório Juvenil, dirigiu-se ao local do velório da vitima Hércules Santos de Oliveira, iniciando contato com seu pai, o senhor que nos reservamos o direito de omitir o nome e a identificação, residente em Pau D’arco a mais de uma década, mostrava-se sereno e consternado pela morte do filho, informou que Hercules era trabalhador e que com 20 anos almejava sua independência financeira do pai e por isso foi lutar para ter sua terra, apesar dos conselhos do pai e dos familiares de que se afasta-se da área nos últimos tempos pois o clima de violência na fazenda aumentara nos últimos meses.

No Velório os deputados ouviram dos familiares todo o sofrimento por que passaram para realizar o sepultamento de seu filho a revolta pelo abandono e o pouco caso que o estado deu ao tratamento dispensado aos corpos, que foram vistos pelos familiares inúmeras vezes levados de um lado a outro, como carga, sem o menor respeito pelos mesmos.

O pai da vítima presta o seguinte testemunho:

Que soube da morte de seu filho por que foi até o hospital de Redenção verificar se Hercules se encontrava entre os mortos; Que reconheceu Hércules morto, ainda na caçamba da Polícia jogado no meio de outros corpos: Que não pode ficar com o corpo que foi levado para dentro do hospital e jogado no chão ao lado de outros corpos; Que foi chamado a reconhecer seu filho mais só pode olhar o rosto e dizer se era Hércules ou não; Que identificou o filho e que o corpo foi ensacado e levado para o IML de Parauapebas; Que pessoa que não sabe identificar prometeu que o corpo seria entregue preparado; Que para sua surpresa quando o corpo de Hércules retornou o IML não permitiu que a família visse seu corpo, apenas foi permitindo fazer novo reconhecimento do rosto de seu filho; Que ao reconhecer o corpo de Hercules o IML novamente o impediu de ver o resto do corpo do filho e entregou o corpo a uma prestadora de serviços de embalsamamento; Que o corpo chegou em avançado estado de decomposição, com a pele soltando; Que entre a hora da morte e a devolução do corpo para o preparo passaram-se mais de 48 horas e o corpo ficou sem nenhum preparo.

Para garantir o sigilo e a integridade de testemunha, nos reservamos o direito de omitir o nome da pessoa que informou ter presenciado as marcas de queimadura em formato de coroa ao redor das perfurações existentes no peito da vítima Hércules, podendo apenas garantir a existência destas evidências que deverão ser confirmadas pelo trabalho da pericia criminal do CPC Renato Chaves que presenciaram as marcas e as registraram.

Informações colhidas em entrevista a testemunha ocular dos fatos desencadeados na operação na Fazenda Santa Lúcia e vitima de tentativa de homicídio.

Na tarde da sexta feira, 26 de maio, após a visita ao velório da vítima Hércules Santos de Oliveira, no município de Pau D’arco, os Deputados receberam e ouviram oficialmente o relato de testemunha ocular da operação policial conflagrada na Fazenda Santa Lúcia, pessoa identificada pelos Deputados que irão guardar sigilo sobre sua identidade uma vez que a mesma, até aquela data, não havia sido ouvida oficialmente pelos responsáveis pela apuração dos acontecimentos e para preservar sua integridade física mesmo que a vitima venha a ficar sob proteção do estado.

                A vítima após ser identificada apresentou o seguinte relato:

“Que acordou por volta de 6:30h, no acampamento que montaram próximo a sede da fazenda Santa Lúcia, que ouviu a aproximação de pessoas na fazenda e julgava ser a policia, procederam como era sua praxe e abandonaram o local do acampamento e refugiaram-se na mata munidos de uma lona preta que armaram para protegerem-se da chuva, com duas pessoas, cada uma posicionada num lado da lona esticando-a para proteger os cerca de vinte e cinco companheiros que se abrigavam sob ela sentados. Que lembra dos diálogos que mantiveram sob a lona enquanto aguardavam aproximação da polícia. Que num destes diálogos perguntou a presidenta da associação, Jane Júlia, o que fariam se a policia chegasse; Que ouviu como resposta a afirmação que seriam presos de novo e após serem soltos voltariam a terra; Que ouviu quando a policia chegou ao local do acampamento e começaram a ouvir barulho de utensílios sendo jogados ao chão, chutados e quebrados; Que estavam sentados de costa para a direção de onde a policia veio; Que ouviu apenas o grito do policial Delegado Miranda, que disse – “Ninguém corre que vai morrer” e começaram os tiros; Que as pessoas começaram a correr junto com os tiros; Que viu a presidenta Jane Júlia nem conseguir se levantar e já tombar próximo a si; Que começou a correr, mas logo após correr alguns metros suas pernas “falharam”, Que caiu no chão e ficou aterrorizada escutando os tiros e gritos; Que tentou correr de novo, mas não conseguia ter forças de se levantar; Que engatinhou pelo mato alto e se escondeu; Que passou a ouvir quando os policiais e o Delegado Miranda gritavam e espancavam os seus companheiros capturados; Que um por um dos capturados foi espancado, ouvindo o barulho dos socos, chutes e gritos; Que o Delegado Miranda gritava perguntando – “quer morrer vagabundo, tu vai morrer”; – “quer correr, corre, corre vagabundo…”; Que ouviu os tiros e os gritos das pessoas sendo mortas; Que ouviu este procedimento se repetir, espancamento, gritos, ordem para fugir e tiros; Que não houve reação; Perguntada sobre as armas afirmou que “Não haviam armas no local”; Que estavam todos sentados, juntos debaixo da lona estendida por dois companheiros em pé protegendo todos da chuva; Que não esperavam esta atitude da polícia; Perguntada como poderia reconhecer a voz do Delegado Miranda, respondeu que o Delegado Miranda interagia muito com eles; Que ele havia reunido muitas vezes com eles; Que o delegado Miranda realizou várias “desapropriações” de posse (refere-se a reintegrações); Que na última vez que o Delegado esteve com eles na reintegração em 20 de abril, os chamou de vagabundos e que isso até havia sido filmado; Perguntada se tem este vídeo, afirma que o vídeo estava no celular da presidenta Jane Júlia e que julgava que ele havia sido recolhido pelos policiais; Que nesta oportunidade, em 20 de abril, ao ir retirar seus pertences do seu “barraco”, o encontrou em chamas, com seus pertences incendiados; Que ao sair do acampamento, resolveu retornar para ajudar outro agricultor que retirava suas coisas; Que neste momento foi seguida por viatura da policia até que saísse da fazenda; Que retornando, ao acampamento na véspera da operação ouviu da presidente Jane Júlia que o Delegado da DECA havia dito que poderiam voltar para a fazenda, que “ninguém da policia de Redenção ou de Pau D’arco vai mexer com vocês, porque vai ter que vir gente do CME pra tirar vocês”; Perguntada quando esta afirmação ocorreu respondeu que foi na data de uma nova ocupação da Estrada em protesto, 29 de março; Que – “o Delegado Miranda prometeu pra gente naquele botequinho lá da entrada, pra lá… pra fazenda tem um buteco. Ele disse com todas as palavras, pra todo mundo ouvir, que a gente poderia voltar pra terra, não queria nós no meio do asfalto, fazendo protesto que era pra nós voltar pra fazenda e permanecer lá porque a liminar existia e a gente ia ter que cumprir, mas quem ia pra tirar nós de lá, só o batalhão de Belém, que ele prometia da palavra dele que nenhum policiamento daqui da região não ia entrar lá”; Que ele disse isto na frente de várias pessoas e na presença do Delegado de Pau D’arco; Que o Delegado Miranda disse – “Eu sou o delegado regional, eu resolvo o problema de vocês, sou o delegado regional, não precisa tar de beca não, que quem manda no sul da Pará é eu” Perguntada sobre o que acha que fez virar o jogo falou que perguntou para presidenta Jane – “Mas Jane você pegou um documento escrito dele, porque eu sei que agora tem que ter um papel escrito dessas coisas e ela disse que ele deu a palavra dele”, mas sempre achou que o delegado estava acertado com os fazendeiros; Perguntada se reconheceria a presença de pessoas estranhas a policia na operação, afirma que não foi possível observar; Que voltou para a fazenda no dia 23 de maio, pois estava na cidade de Goiânia, capital do Estado de Goiás, acompanhando um neto hemofílico que tratava-se naquela cidade; Que voltou por causa da promessa da presidenta que o Delegado da DECA estava com eles; Perguntada se conhecia o nome deste delegado, disse que não sabia; Perguntada se este delegado era o delegado Miranda, disse não saber; Perguntada porque não fugiram de uma vez ao saber que a Policia se aproximava do local onde estavam, respondeu que perguntou isso pra presidenta Jane Júlia e que dela ouviu – “policia não vai andar na chuva, nem no mato uma hora dessa” e completou “correr de policia pra que? Se eles vier nós vamos cumprir a ordem, vamos se preso, cumprir…”; Que nunca imaginavam que aquilo ia acontecer, Que não deu tempo de nada; Que a policia já chegou atirando e gritando – “Não corre que vai todo mundo morrer”; Que depois que a policia parou de matar as pessoas eles ligaram as sirenes das viaturas na sede da fazenda; Que isso facilitou sua fuga, pois tinha referencia para se afastar de onde a policia estava; Que começou a fugir e só as 16h chegou a casa de uma família e pediu abrigo; Que depois disto ficou escondida até aquela data, quando falou com um dos sobreviventes; Que soube por este, no telefone que havia outros sobreviventes, mas não havia se encontrado com estes outros pessoalmente nem falado por telefone; Perguntada novamente sobre a afirmação de que o delegado afirmara que eles eram vagabundos e quando foi isso, respondeu que – “foi uma semana depois que ele prometeu, ele chegou lá, dizendo pra gente que nós era um bando de bandido e que não podia permanecer no corredor, que nós tava atrapalhando o fazendeiro, falando um bando de coisas a favor da fazenda e indo contra nós xingando e que estava com os carros pra tirar as coisas de lá e que nem no corredor podia ficar, que o corredor era público, que não podia ficar nem no corredor que ia ser preso”; Encerra afirmando que não credita no que aconteceu e que quer justiça; Que lá tinha muito milho que foi plantado; Que tinha maxixe; Que tinha melancia; Que lá agora tinha 20 sacas de arroz pra colher “numa roça só…”

Das informações colhidas em reunião com a sociedade civil organizada na sede do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais, às 16h do dia 26 de maio de 2017

            Ainda na tarde do dia 26 de maio antes do embarque de retorno a Belém a comitiva dos Deputados membros da Comissão de Direitos Humanos da Alepa, foi esperada pela sociedade civil organizada para ouvir relatos sobre a situação do acirramento dos conflitos fundiários na região e ouviu atentamente relatos que dão conta de 3 aspectos fundamentais:

1)      O esvaziamento institucional do INCRA SR27, que vem tendo seus recursos para investimentos em infraestrutura agrária de assentamentos reduzidos ano após ano, precarizando as condições mínimas de subsistência dos projetos de assentamento, estimulando colonos a abandonarem os mesmos;

2)      A proliferação de empresas de segurança armada com a utilização de pistoleiros entre os seguranças profissionais e o incremento da violência destes contra os ocupantes de áreas em litígio;

3)      A necessidade de o estado Brasileiro dar uma resposta a paralização absoluta da reforma agrária, como forma de conter os conflitos no campo.

Quanto ao ocorrido surgem informações que revelam que:

1)      A Associação dos Agricultores da Fazenda Santa Lucia em Pau D’arco foi recentemente reativada e que os membros da família de Jane Julia e Tonho, bem como seu irmão Ronaldo, conhecido como Lico eram recentes na ocupação;

2)      A fazenda vem de um longo histórico de ocupações e reitegrações de posse iniciadas em 2010, quando o suposto proprietário, Sr. Honorato Babinsky ainda estava vivo e a fazenda encontrava-se abandonada;

3)      Ao longo das ocupações e reocupações da fazenda poucos ocupantes originários resistiram nos lotes de 30 alqueires destinados para cada uma das aproximadamente 200 familias que estavam no local;

4)      Que mesmo com todas estas idas e vindas, os ocupantes da área sempre se preocuparam em produzir em seus lotes;

5)      Que após a última reintegração de posse, os herdeiros do proprietário tentaram retomar a área das imediações da sede, trazendo algumas cabeças de gado e tratando a pastagem abandonada deste a década de 2000;

6)      Que nesta oportunidade foi contratada a empresa Elmo Segurança EPP Ltda e que os barracos e pertences dos ocupantes passaram a ser queimados e destruídos;

7)      Que a presença da empresa aumentou o clima de tensão na área;

8)      Que a presença do Tonho e de outros acusados de crimes na direção da entidade líder do assentamento é recente e não tem seis meses, que o afastamento da FETRAF se deve a isto;

9)      Que o precedente aberto pela policia coma chacina amedronta os movimentos sociais da região pois pode significar um aumento das atividades de pistoleiros travestidos e infiltrados nas empresas de segurança;

10)  Que os corpos das vitimas foram tratados sem dignidade, transportados como carcaças e que o estado do Pará não deu o menor suporte as famílias das vítimas;

11)  Que o direito de velar os corpos foi negado aos familiares pelo elevado estado de decomposição das vitimas, todas com mais de 48 horas após a morte sem um tratamento adequado;

12)  Que ainda existem desaparecidos, em especial a agricultora conhecida como Baixinha, que foi vista e teve o registro de sua saída confirmada no Hospital Regional de Redenção, por volta das 17h de quinta feira, na companhia do Delegado identificado como Ronaldo, que a mesma deu entrada no Hospital na companhia de seu esposo vítima da operação policial baleado nas nádegas, tendo sido registrada como acompanhante do mesmo e que até a presente data não foi localizada pela família e tampouco retornou ao Hospital Regional;

13)  Que vítima da operação policial e testemunha ocular da ação relatou a dirigentes sindicais locais, que esta escondida por temer por sua vida, ter visto o agricultor conhecido como Janary sair algemado do local do crime e o mesmo continua desaparecido;

14)  Registram à Comissão que consideram absurdo a informação veiculada em reportagem da TV Liberal, que pode ser visualizada no link a seguir https://www.youtube.com/watch?v=TdRsuT3OavI que dá conta que o médico legista Dr. Paulo Ewerton do IML de Marabá, afirmou a repórter Fabiane Barbosa que a equipe do IML não foi ao local dos fatos na data do ocorrido, do que depreende-se que a pericia só iniciou o levantamento da cena de crime mais de 24 horas depois dos eventos e após a chegada do Procurador Geral de Justiça do Pará e demais autoridades federais e estaduais;

15)  Exigem dos Deputados um posicionamento firme da Assembleia Legislativa do Estado do Pará, repudiando as mortes e a atitude da policia local que parece ter agido com desídia quanto a apuração.

Considerações e conclusões sobre os fatos relatados por vitimas, testemunhas e pelos fatos presenciados pela Comissão de Direitos Humanos da Alepa em Redenção e Pau D’arco por oportunidade da diligência do dia 26 de maio de 2017

Quanto ao desfecho da operação de cumprimento de mandatos de busca e apreensão e prisões preventivas e temporárias:

1)      Apesar de parecerem divergentes ambas as versões apresentadas dão conta de que os policiais envolvidos na operação deliberadamente deixaram de observar regras claras de conduta quanto a preservação da cena dos fatos, contribuindo decisivamente para a ocultação da forma em que o resultado de 10 vítimas fatais foi produzido;

2)      Este comando emanado do encarregado da operação policial, portanto o Delegado identificado como “Miranda”, a ser elucidado pelas investigações de se tratar do DelegadoSuperintendente da 13ª RISP Araguaia – Redenção, DPC ANTÔNIO GOMES MIRANDA NETO, ou do Delegado Titular da Delegacia Especializada em Conflitos Agrarios de Redenção, DPC VALDIVINO MIRANDA DA SILVA JÚNIOR, encontrou concordância com o oficial e /ou o policial mais antigo presente no palco de operações que tinha o dever funcional de preservar a cena do crime mesmo diante de comando divergente do responsável pela operação conforme expresso no Artigo 169, caput do CPP;

3)      A decisão de descaracterizar a cena do crime se impôs inclusive sobre os peritos do CPC “Renato Chaves”, que foram na prática impedidos de vistoriar a cena dos fatos pela absoluta falta de apoio operacional das forças de segurança locais, inclusive no que tange ao traslado dos mesmos (peritos) ao local;

4)      A decisão de descaracterizar a cena do crime sobrecarregou o CPC “Renato Chaves”, forçado a tratar da remoção dos corpos para tentar salvar a analise forense, com reflexos evidentes no direito das famílias de velar seus mortos;

5)      A contaminação da cena do crime torna impossível precisar a individualização das condutas dos agentes de segurança e dos mortos, inclusive pela manipulação das armas supostamente apreendidas, abrindo precedentes técnicos para o arquivamento dos inquéritos policiais, a não aceitação das denúncias e/ou o arquivamento dos processos sem julgamento preparando a impunidade a longo prazo dos responsáveis, este recurso processual já foi observado no caso da Chacina do Tapanã em 1994, quando cerca de 80 policiais militares foram alegadamente acossados numa suposta troca de tiros contra 2 adolescentes que supostamente portavam um revolver calibre 32 e um revolver calibre 38;

6)      A ausência de Delegados Corregedores lotados nas RISPS de Marabá e Redenção contribuiu decisivamente para o resultado da operação, pois impossibilitou a rápida recomposição do cumprimento dos procedimentos legais cabíveis;

7)      A ausência de suporte psicossocial das vítimas e seus familiares evidenciada pelo não custeio da preservação dos corpos em Marabá e Parauapebas importou em descumprimento do SUAS, vulnerabilizando ainda mais os familiares dos mortos, o que impediu a realização de velórios adequados e dignos;

8)      Independente do histórico das vítimas e do conflito agrário instalado, flagrantes violações de direitos humanos são observadas no caso em tela, com especial ênfase para a possível prática de tortura e execuções;

9)      Em razão do elevado número de mortos de uma mesma família e o fato de que seus integrantes lideravam a ocupação é plausível afirmar que a operação tinha o propósito velado de desmantelar qualquer capacidade de rearticulação da ocupação favorecendo os pretensos proprietários e encerrando de vez o conflito agrário;

10)  Pela mesma razão é plausível afirmar que a morte das lideranças da ocupação serviu ao propósito de intimidar movimentos sociais legítimos pelo acesso a terra;

11)  A familiaridade dos ocupantes com a polícia, em especial com o Delegado “Miranda” torna implausível a tese da agressão prévia dos ocupantes a aproximação da equipe policial na operação

Diante das conclusões acima elencadas ainda restam questionamentos a serem feitos ao Sistema Integrado de Segurança Pública – SISP sendo SOS seguintes:

1)      Quem era autoridade policial judiciária que comandava a operação?

2)      O DPC Antonio Miranda Gomes Neto estava presente na operação?

3)      O DPC Valdivino Miranda da Silva Junior estava presente na operação?

4)      Quem era o comandante do Grupo Tático Operacional da PM?

5)      Havia algum oficial da polícia militar acompanhando a equipe e estranho ao GTO mobilizado para a tarefa?

6)      Havia a presença de pessoas estranhas as corporações policiais?

7)      Caso afirmativo, quem eram, o que faziam e participaram sob o arbítrio de que autoridade policial?

8)      De quem emanou a ordem para a remoção dos corpos e a não preservação da cena dos fatos?

9)      Porque os Peritos do CPC “Renato Chaves” não foram conduzidos ao local dos fatos mesmos após a remoção do corpos?

10)  As armas apresentadas pela polícia como apreendidas em poder das vitímas fatais, foram periciadas?

11)  Foram recolhidos outros objetos na cena do crime, como celulares e documentos? Caso positivo os mesmos foram encaminhados para a pericia?

12)  Foi efetuada a prisão de algum dos ocupantes independente de mandado de prisão expedido;

13)  Qual o paradeiro da sra. conhecida como “baixinha”, companheira de sobrevivente que deixou o hospital em companhia de suposto policial?

14)  Passados mais de 100 horas do ocorrido os RELATÓRIOS DE ACOMPANHAMENTO DA LETALIDADE E MORTALIDADE a serem preenchidos por cada policial militar que efetuou disparo de arma de fogo, foram encaminhados no prazo legal ao CONSEP? Caso negativo, o que ocorreu? Qual ou quais policiais não o fizeram? Qual a atitude do Comando quanto ao cumprimento do dever de prestar as informações?

15)  O CPC “Renato Chaves” coletou evidências de disparo de armas das fogo supostamente apreendidas na operação através do método de coleta de vestígios de pólvora na pele das vítimas? Caso negativo, porque não procedeu desta forma?

16)  Quais os procedimentos realizados pelo CPC “Renato Chaves” em cada um dos corpos das vítimas?

Acreditamos que estes questionamentos são fundamentais para a elucidação das condutas dos policiais envolvidos na operação e poderão lançar luz aos fatos uma vez que não é aceitável supor que qualquer policial civil ou militar desconhecesse os procedimentos a serem adotados em casos como o acontecido, o que os envolve em suspeitas e os torna definitivamente implicados criminalmente com o resultado da operação.

PROPOSIÇÕES E RECOMENDAÇÕES

Sem prejuízo de outras que venham a ser suscitadas em razão dos debates e em especial por ocasião do Seminário de Nivelamento pactuado em audiência pública sobre o acirramento da violência no campo realizada na ALEPA, no auditório João Batista no dia 23.05.2017 promovida pelo Deputado Bordalo, a ser realizado no dia 02 de junho de 2017, novamente no auditório João Batista recomenda:

1)      Propor às Clínicas de Direitos Humanos das Universidades do Estado a formação de um observatório da violência no campo com o objetivo de realizar o levantamento das listas de ameaçados de morte e a identificação dos conflitos que originam os crimes, de forma a estabelecer o nexo de causalidade entre os crimes e os conflitos que lhe dão causa;

2)      Instaurar, Comissão Representativa de Movimentos Sociais, Organizações não Governamentais e as Secretarias de Estado de Justiça e Direitos Humanos e a Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social para a consolidação das informações constantes nas listas de defensores ameaçados em razão de conflitos no campo e para verificar se estas ameaças se transformaram em procedimentos investigatórios, a partir da verificação das informações junto ao Tribunal de Justiça e à SEGUP;

3)      Reinstalar em caráter de urgência, a Comissão do Consep criada para o acompanhamento de conflitos agrários, posto que a mesma foi criada por resolução, todavia há vários meses não se reúne;

4)      Acelerar a tratativas para implantação do protocolo referente à lei estadual do Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos – PPDDH;

5)      Acompanhar e fiscalizar o fiel cumprimento da Resolução do Consep que regulamenta o cumprimento de liminares de reintegração de posse e resulte na correção de práticas que possam configurar atividades ilegais;

6)      Retomar as tentativas de conciliação dos conflitos por meio da Ouvidoria Agrária do TJE;

7)      Tentativa de conciliação e cumprimento voluntário das decisões judiciais;

8)      Apresentação da SEGUP acerca dos casos em apuração referentes aos crimes ocorridos no âmbito de conflitos agrários, a partir da lista de ameaçados devidamente reconhecidos e acolhidos pelo PPDDH e

9)      Criação de uma Câmara Intersecretarial para a internalização das decisões do Sistema Interamericano de Direitos Humanos na prática dos agentes estatais e do sistema estadual de justiça.

É o relatório,

Palácio Cabanagem, Belém, 31 de maio de 2017

Deputado Bordalo

Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da ALEPA


Deputado Ozório Juvenil

Titular da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da ALEPA

Deputado Lélio Costa

Titular da Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da ALEPA