Futuro ministro nega perseguição a Lula, diz que Bolsonaro é “ponderado e moderado”, defende redução da maioridade penal para “crimes graves” e flexibilização do porte de armas
por Redação RBA
A assessoria do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva divulgou nota, após entrevista coletiva do juiz Sérgio Moro, na tarde de hoje (6), em que desmente a afirmação do futuro ministro da Justiça de que ele foi condenado por cometer crime. A fala de Moro “contrasta com a própria sentença de sua autoria que fala em ‘atos de ofício indeterminados’”, diz a nota.
Segundo a assessoria, “Moro condenou Lula sem identificar qual teria sido o ato ilegal que ele supostamente cometeu”. O magistrado de Curitiba foi quem “cometeu vários atos ilegais, definidos e comprovados, contra Lula”, diz a nota, citando a condução coercitiva de 4 de março de 2016, gravação ilegal dos seus advogados, divulgação ilegal de conversas de familiares de Lula, divulgação ilegal de grampo ilegal de conversa com a então presidenta da República Dilma Rousseff, entre outros.
Na coletiva, o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba negou que tenha sido indicado para o Ministério da Justiça como uma “recompensa” por sua atuação na Lava Jato e ter condenado Lula. “O ex-presidente foi condenado e preso. Ele cometeu um crime. (A condenação) foi confirmada pela corte de apelação (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) e foi o próprio tribunal que deu a ordem de prisão, previamente autorizada pelo Supremo Tribunal Federal. O crime foi investigado e provado.” Depois, acrescentou: “não existe a menor chance de usar o ministério para perseguição política”.
Moro afirmou aos jornalistas que realizou a coletiva “em homenagem ao trabalho que a imprensa realizou durante toda a Lava Jato”. A imprensa foi crítica contumaz dos governos Lula e Dilma e porta-voz frequente de vazamentos seletivos de informações por parte da força tarefa da Lava Jato. A “condenação” prévia por parte da opinião pública foi estratégia declarada da operação, desde seu início em 2014.
“A liberdade de imprensa foi fundamental, porque informou (sobre) esses crimes investigados e punidos.” Ele negou que a força tarefa tenha tido objetivos políticos, e justificou dizendo terem sido presas “pessoas politicamente poderosas” e pertencentes aos “espectros políticos os mais diferenciados”. A coletiva se estendeu por 85 minutos.
Segundo ele, a Lava Jato teve o propósito de “quebrar a tradição de impunidade” do país. Disse ainda que os crimes de ódio serão combatidos, por serem “intoleráveis”, e que para isso mobilizará “o aparato da Polícia Federal”. Mencionou o assassinato da vereadora Marielle Franco (Psol) e de seu motorista Anderson Pedro Gomes como exemplos de crimes de ódio que “têm que ser solucionados”.
Disse que aceitou o convite do presidente eleito Jair Bolsonaro por haver “convergências importantes” e que a prioridade de sua gestão será o combate à corrupção e ao crime organizado. E que respeitará a Constituição, as leis e os direitos fundamentais.
Defendeu a redução da maioridade penal para crimes de homicídio e estupro e a flexibilização do porte de armas. “Um adolescente acima de 16 anos tem percepção de que não pode matar.” Embora reconheça que a redução não resolve a questão da criminalidade, disse que “há que se fazer justiça em casos individuais” para reparar pessoas que perdem membros da família vitimas de assassinato.
Sobre armas, ponderou que “uma flexibilização excessiva pode ser utilizada como armamento para organizações criminosas”, acrescentando: “Tem de pensar quantas armas o indivíduo poderá ter em sua casa”.
O juiz disse que defende a liberdade de manifestação, mas que responsáveis por invasões de propriedade privada, por motivações político-partidárias, têm que responder por danos a direitos a terceiros. No entanto, ressalvou que classificar essas manifestações como terroristas “não parece adequado”.
Estado de direito
Moro prometeu relação “respeitosa” com o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal. Questionado sobre o comportamento do presidente eleito em relação ao Estado de direito, declarou que a avaliação que tem sobre ele é de que é “uma pessoa moderada”. “Não vejo risco à democracia e ao Estado de direito.”
Uma repórter quis saber se o futuro chefe do Executivo pode ser considerado moderado ou ponderado se, em situações diferentes, ficou conhecido por defender a tortura, a ditadura e grupos de extermínio, além de ameaçar opositores com prisão ou exílio. Segundo Moro, são “declarações pretéritas, mas estamos olhando para o futuro”. Ele acrescentou não haver propostas concretas do futuro governo que ofendam minorias.
Deu resposta semelhante ao ser questionado sobre se a pressão da extrema direita pode prejudicar sua gestão. “Essas questões têm que ser colocadas em termos concretos, havendo uma proposta de politica pública. Até o momento não existe nada. Tenho plena convicção de que essas minorias poderão exercer suas liberdades. Todos têm direito à mesma proteção da lei. Não vejo nada além de receios infundados.”
“Não há possibilidade de politicas persecutórias contra homossexuais”, exemplificou. “A possibilidade de haver politicas discriminatórias contra minorias é zero.”
Moro também foi questionado sobre a composição do ministério de Bolsonaro com pessoas investigadas, tais como o deputado Onyx Lorenzoni e o futuro ministro da Economia (ou Fazenda) Paulo Guedes. “Não conheço as investigações. O que tenho noticia é que são incipientes.” Declarou que, como não conhece os processos, não sabe dizer se são consistentes ou não.
Disse não acreditar ter sido convidado por Bolsonaro para o superministério da Justiça como uma estratégia de marketing. “Fui convidado dentro de uma convergência de planos definidos. Se se faz um bom trabalho é natural que se possa faturar politicamente”, acrescentou, sobre o que o presidente eleito pode ganhar com sua gestão na Justiça.
Moro afirmou ter encontrado Bolsonaro “por acaso em 2017 ou 2016 no aeroporto”. “Este ano fui procurado dia 23 de outubro por Paulo Guedes, que trazia uma sondagem acerca do meu interesse de compor o governo.” Segundo o magistrado, sua resposta foi de que só poderia tratar do assunto depois das eleições “E mais ou menos declinei o que seria necessário (em termos de convergência de ideias).”
De acordo com o juiz, apenas em 1° de novembro ele e o eleito conversaram mais longamente. Na ocasião, “me pareceu uma pessoa bastante ponderada”, disse.
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