Por Eduardo Maretti, da RBA

O anúncio da privatização da gigante Eletrobras pelo governo faz parte da lógica que preside o Brasil desde a posse de Michel Temer em 13 de maio de 2016, após o afastamento de Dilma Rousseff. “O Estado está perdendo cada vez mais a capacidade de planejamento e de definição de políticas públicas e objetivos estratégicos. Passa por Petrobras, Eletrobras, BNDES, bancos públicos. Trata-se de um projeto que objetiva tirar a capacidade de planejamento e de estabelecimento de políticas públicas do Estado e do país”, diz o economista Jorge Mattoso, presidente da Caixa Econômica Federal no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.

Imediatamente após o anúncio, a Bovespa disparou e o principal índice (Ibovespa) subiu 2,01%, chegando a 70.011 pontos. “Isso só quer dizer que a empresa vai se valorizar do ponto de vista de suas ações, que estavam desvalorizadas. Só que não quer dizer nada do ponto de vista estratégico, de longo prazo, sobre a soberania nacional, o planejamento do setor”, avalia Mattoso. “O país não vai ter mais o controle sobre o preço, a decisão vai ser privada. É um crime contra a soberania nacional. A empresa pode ser comprada por uma estatal chinesa, uma multinacional europeia. Estão desconstruindo os instrumentos de coordenação de uma área importantíssima e indispensável para o crescimento e sobretudo para a produção e indústria nacional.”

Em artigo, a ex-presidenta Dilma também utiliza o termo “crime” para se referir à privatização: “Será um crime contra a soberania nacional, contra a segurança energética do país e contra o povo brasileiro”.

Para Mattoso, a política segue a já conhecida “lógica de subordinação aos interesses privados, estrangeiros e do mercado financeiro”. De acordo com essa lógica, o setor hidrelétrico brasileiro será controlado por empresas privadas e muito possivelmente estrangeiras. “Não teremos mais a capacidade de planejar a produção e distribuição de energia.”

Mattoso menciona outro comentário “apropriado” de Dilma no Twitter, chamando a atenção para os riscos de se privatizar o sistema: além do preço da energia, o risco de apagão.

“Vender a Eletrobras é abrir mão da segurança energética. Como ocorreu em 2001, no governo FHC, significa deixar o país sujeito a apagões”, escreveu Dilma. “O resultado é um só: o consumidor vai pagar uma conta de luz estratosférica por uma energia que não terá fornecimento garantido. Já entregaram as termelétricas da Petrobras. Pretendem vender na bacia das almas nossas principais hidrelétricas e linhas de transmissão”, acrescentou.

Em entrevista coletiva na manhã de hoje, o ministro de Minas e Energia, Fernando Bezerra Coelho Filho, com discurso semelhante ao do presidente da Petrobras, Pedro Parente, prometeu preços melhores ao consumidor de energia elétrica. “Com a eficiência e redução do custo, nossa estimativa é de que no médio prazo tenhamos uma conta de energia mais barata”, previu. Segundo ele, a privatização será concluída até o primeiro semestre de 2018.

Eletronuclear e Itaipu

Num primeiro momento, o governo não pensa em incluir a Eletronuclear e a Usina de Itaipu no processo de “desestatização” da Eletrobras. No caso da Eletronuclear, responsável pela energia nuclear do país, porque precisaria mexer na Constituição. Quanto a Itaipu, porque é uma empresa binacional e o governo brasileiro precisa negociar com o Paraguai. “Por mais que o Paraguai esteja sob controle do mesmo tipo de política, não é fácil, isso pode levar cinco, 10 anos”, diz Mattoso.

A capacidade instalada da Eletrobras é de 47 mil megawatt (MW), com previsão de chegar a 49,49 mil MW com obras de usinas em andamento. A companhia possui 47 usinas hidrelétricas, 114 termelétricas a gás natural, óleo e carvão, duas termonucleares, 69 usinas eólicas e uma usina solar, próprias ou em parcerias, em todo o país.

“O governo fica na ótica fiscal e não trata da questão estratégica de coordenação, planejamento e criação de políticas públicas, de constituição de mecanismos para o crescimento. É disso que deveria estar se tratando. A discussão sobre o crescimento não existe”, diz Mattoso.

O pior, destaca, é que o próximo governo “vai pegar um país destruído”, com cada vez menos mecanismos de planejamento estratégico por parte do Estado.

Fonte: Rede Brasil Atual