por Erika Gavinho

A Constituição Federal de 1988 consagrou o direito à liberdade artística no inciso IX do artigo 5º, no rol dos chamados Direitos e Garantias Fundamentais. Mais do que afirmar que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação”, a Constituição informou que essas liberdades devem ser exercidas “independentemente de censura ou licença”.

A previsão, na lei maior do país, da liberdade artística sem censura ou licença é uma novidade na história do constitucionalismo brasileiro. Nossas Constituições anteriores, embora a tenham previsto, sempre vinculavam seu exercício ao cumprimento de determinadas condições. Não se podia dizer, portanto, que havia uma efetiva liberdade.

Como a Constituição de 1988 foi promulgada depois de um grande período de ditadura, em que a censura era uma das formas de o Estado brasileiro se impor sobre os seus cidadãos, quis o Constituinte garantir essa liberdade sem quaisquer restrições, para não haver dúvidas da opção da sociedade brasileira por uma sociedade livre e plural, sinônimo de efetiva democracia.

Já se passaram três décadas do fim da ditadura militar, ano que vem comemoram-se os 30 anos da Constituição de 1988, conhecida por Constituição Cidadã, e justo agora a liberdade artística está sofrendo violento ataque de grupos da sociedade, da política, da polícia e até do Judiciário.

É fato que, no Brasil, temos uma cultura censória. Basta verificar a quantidade de decisões judiciais proibindo a livre expressão dessas liberdades, com honrosa exceção ao Supremo Tribunal Federal que, no seu papel de guardião da Constituição, tem aclarado a todos a verdadeira intenção da nossa Carta Magna ao proteger a liberdade artística e de expressão.

Portanto, qualquer medida que atente contra essa garantia é inconstitucional. Qualquer tentativa de se estabelecer censura prévia é inconstitucional.

Muitos homens e mulheres morreram e sofreram as mais violentas violações às suas integridades física, moral e psicológica para chegarmos a esse patamar civilizatório: nada de licença ou censura prévia ao exercício da liberdade artística.

Essa não é uma discussão entre direita e esquerda, mas entre a civilização e o medievo. A História já nos mostrou aonde a censura à arte costuma nos levar. Não podemos admitir retrocessos neste campo.

Diante disso, embora tenha profundas críticas à judicialização da vida, entendo que, caso as tentativas de censurar as artes e a cultura brasileira permaneçam, há de se judicializar a questão, para que o Poder Judiciário, mais especificamente o Supremo Tribunal Federal, garanta, uma vez mais, a liberdade artística nos exatos termos do que prevê a nossa Constituição.

Não é hora de silêncios convenientes! Precisamos todos, que têm a democracia como um valor fundamental, nos rebelar contra esse ataque e nos valermos das regras do Estado de Direito para fazermos prevalecer a Constituição Federal: liberdade artística sem quaisquer licenças e censuras prévias.

FONTE: http://midianinja.org/erickagavinho/liberdade-ontem-hoje-e-sempre/