Elas vivem umbilicalmente ligadas à vida real. São as maiores vítimas da violência dentro e fora de casa

por Juan Arias

As mulheres brasileiras são a maioria (53%) entre os eleitores nas eleições presidenciais que estão à porta. E são sempre as que mais votam. Querendo, elas podem decidir quem presidirá o país em um dos momentos mais difíceis e perigosos após a ditadura militar. A democracia, que muitos vêem ameaçada pelo ressurgimento de uma extrema direita militarista e violenta, presidida pelo capitão da reserva, Bolsonaro, poderá ser salva graças às mulheres.

Elas começaram a se mexer com força, como indica o movimento “Mulheres Unidas contra Bolsonaro”, que já coletou mais de um milhão de assinaturas no Facebook e está conseguindo 10 mil membros por minuto. É uma aposta feminina contra o ressurgimento de uma política que visa resolver os problemas deste convulsionado continente com balas, oferecendo a violência como um talismã para a solução de todos os males.

Sempre apostei em uma solução positiva para este país, mesmo quando tudo parecia ficar política e socialmente sombrio. Quando, meses atrás, soavam como luto os sinos da abstenção nas eleições, alcançando 40% do eleitorado, continuei acreditando que, no final, a sensatez triunfaria, sob pena de colocar o país diante de um abismo com sérias repercussões econômicas e morais que acabam atingindo sempre os mais frágeis. Aqueles que hoje parecem dispostos a não votar ou a anular o voto, já são cada vez em menor número e estão se aproximando das taxas normais das eleições anteriores. O senso de responsabilidade está vencendo.

Uma vez terminadas as eleições, cuja aposta espero que seja naqueles que defendem os melhores valores desta sociedade que quer viver em paz, poderemos ver o peso real que o voto feminino teve contra os fantasmas da intolerância e do populismo. As mulheres, afinal, vivem umbilicalmente ligadas à vida real, à dor de cada dia. Elas são as maiores vítimas da violência dentro e fora de casa.

Um movimento feminino contra o candidato que ameaça incendiar o país com a violência e com nostalgias de golpes militares é a melhor demonstração de que a mulher, desde o Homo Sapiens, continua a ser a defensora da vida que nela é gerada. Da vida e dos valores da liberdade e da religião como o motor da libertação contra a tirania dos ídolos. Gea, a primeira divindade da História, era uma mulher. Era a deusa da Terra e da fecundidade. Enquanto os homens lutavam em guerras, as mulheres cultivavam a vida.

A mulher, apesar de ter sido estigmatizada com o selo da fragilidade, como se tem visto com a candidata negra Marina Silva, sempre se revelou mais forte que o homem, principalmente nas horas de dor e derrota. E isso, apesar do fato de que os homens, que provavelmente dominavam até mesmo a linguagem, tingirem de feminino todos os substantivos femininos que se referem à violência. Assim, eles fizeram a guerra feminina. Feminino são as batalhas, as armas, as balas, a bomba atômica. Até as flechas envenenadas dos nativos são femininas. E a pólvora. São femininas a pobreza, a escravidão e a derrota.

O arrojo, o heroísmo e o orgulho foram reservados para eles, os homens. São masculinos. E no entanto, é nos lagos do feminino que os conceitos mais nobres da Humanidade são reproduzidos, como a paz e a esperança, junto com a criatividade, a arte e a cultura. Feminina é a vida. São as mãos que curam, abraçam e nutrem. A luz é mulher, assim como a poesia.

O mundo escureceu quando os homens masculinizaram os deuses que se tornaram violentos. A religião foi sempre feminina até que alguém a transformasse em um instrumento de poder e prevaricação contra os mais frágeis. A política é feminina, assim como a democracia. E no Brasil, poderão ser as mulheres que devolverão a esperança a esta sociedade amargurada e irritada. A liberdade, como a igualdade, é profundamente feminina, e as mulheres brasileiras estão lutando para que não acabem profanadas nas garras da intolerância, que é a bandeira de todos os famintos e sedentos de violência.

FONTE: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/09/14/opinion/1536933199_059245.html